Hoje em dia um dos assuntos mais
falados no campo da nutrição, é se de facto devemos ou não consumir leite e os
seus derivados. Depois de muitos artigos já publicados com opiniões contraditórias, muita gente continua sem saber afinal qual a atitude que devem tomar em prol da sua saúde. Afinal, devemos ou não consumir lacticínios? Pois bem, decidi investigar por mim própria todos os prós e contras que esta questão envolve e elaborar uma conclusão em função da qual guiaria as minhas próprias escolhas alimentares.

Os lacticínios são alimentos nutricionalmente ricos e equilibrados. Apresentam uma composição variável no que toca ao teor de hidratos de carbono e gordura, o que consequentemente influencia o seu valor calórico, e contribuem razoavelmente no fornecimento de proteínas ao nosso organismo. Cada caso é um caso, e deve ser analisado individualmente; contudo, é possível afirmar que para o adulto saudável, o ideal é o consumo de lacticínios magros, uma vez que a gordura presente nestes alimentos é de origem animal - apresenta colesterol - e saturada - o que contribui para aumentar o risco de desenvolvimento de doenças cardiovasculares. No que toca aos açúcares, a situação é a mesma, mas é possível generalizar para o adulto saudável a recomendação de lacticínios com um teor de açúcares (hidratos de carbono absorvidos rapidamente) inferior a 7g/100ml, uma vez que o consumo frequente de grandes quantidades de açúcares aumenta o risco de desenvolvimento de diabetes e de outras perturbações metabólicas, bem como de aumento de peso. Mas nem tudo é mau nestes alimentos: as proteínas que nos fornecem, dado que também provêm de "fontes animais", contêm todos os aminoácidos que o nosso corpo precisa para se desenvolver e manter saudável, e a sua absorção é eficaz (superior a 50%). Além destes nutrientes, fornecem-nos ainda outros que, apesar de presentes em menor quantidade, são igualmente importantes na manutenção da nossa saúde, pois participam em reações químicas e funções básicas do nosso organismo. São eles o cálcio, o potássio, o magnésio, o zinco, vitaminas A (maior quantidade nos produtos mais "gordos") e D (lacticínios enriquecidos), e algumas do complexo B.
Uma outra questão a realçar nos lacticínios e que constitui uma mais-valia deste grupo alimentar é a biodisponibilidade do cálcio (isto é, a percentagem de cálcio absorvida). Muitos outros alimentos apresentam cálcio na sua composição, como vegetais de folha verde - couve, couve chinesa, espinafres; brócolos, feijão cozido, frutos oleaginosos, e derivados de soja fortificados; contudo, são poucos os alimentos onde a percentagem de cálcio absorvida supera a dos lacticínios. Os 30%-35% de biodisponibilidade apresentados pelo leite e derivados são apenas superados pelos 50%-60% apresentados pelos brócolos, couve e couve chinesa, deixando os outros alimentos referidos com menor potencial de fornecimento de cálcio. No entanto, não conta apenas a percentagem absorvida mas também a quantidade total presente. Combinando estes dois factores, os lacticínios ganham o prémio para melhor fonte de cálcio, uma vez que apresentam maior quantidade de cálcio do que os brócolos, couve e couve chinesa, ao ponto de a quantidade absorvida ser maior com estes do que com essas fontes vegetais. O facto de apresentarem vitamina D e fósforo na sua composição ajuda a que o cálcio seja mais facilmente absorvido e fixado nos ossos.
Uma teoria que surgiu recentemente e que desacreditou os lacticínios na questão do cálcio foi a de que os lacticínios causam acidificação do pH sanguíneo, e que para compensar essa ocorrência o organismo vai buscar cálcio aos ossos. Ou seja, basicamente o cálcio dos lacticínios não é utilizado pelo nosso organismo, se não para compensar os "estragos" que o consumo destes mesmos alimentos causou. Esta teoria baseou-se no facto de estes alimentos serem uma boa fonte proteica, e um alto teor proteico leva a uma "sobrecarga ácida", que é compensada com o cálcio que é retirado dos ossos e posto em circulação, que neutraliza essa acidez. Pois é, mas a verdade é que não existem de facto provas conclusivas desta teoria. A boa notícia para os amantes do leite e dos seus derivados é que de facto o "potencial ácido" destes alimentos não é assim tão elevado. De facto, este valor para o leite e o iogurte é reduzido, aumentando apenas a nível dos queijos, e apenas ultrapassando o de peixe, carne e derivados da carne quando os queijos apresentam mais de 15g de proteína por 100g de produto. Resumindo: cuidado com o queijo e atenção ao seu valor proteico, e no que toca ao leite e iogurte, desde que consumidos moderadamente, não há problema. Há alimentos mais preocupantes nesse assunto e já referidos, nomeadamente a carne e derivados, e peixe.
Contudo, existem de facto aspectos negativos relativamente a este grupo alimentar que se revelam incontornáveis. Cada vez mais a associação entre lacticínios e cancro tem vindo a ser estudada e comentada, e se é verdade que para certos tipos de cancro essa relação é inconclusiva e necessita de mais estudos, como é o caso do cancro da mama, e para outras até pode revelar um efeito protetor desde que consumidos na sua versão magra, como o cancro do cólon e recto (efeito protetor devido ao cálcio), para outros o efeito parece inverso. Para o cancro do ovário e da próstata, os lacticínios - sobretudo o leite - parece(m) ter um efeito nefasto. No caso do ovário, suspeita-se que esse feito se deve à presença de D-galactose, um "açúcar" do leite que é fermentado aquando da produção de iogurte e queijo e que por isso mesmo existe em menor quantidade nos derivados do leite. Este açúcar aumenta o dano celular e diminui a resposta imunitária. Já ao nível da próstata, essa relação deve-se à presença de IGF-1 no leite ou ao estímulo da sua produção causada pelo consumo de leite, que estimula o crescimento de células cancerígenas.

Por fim, um aspecto óbvio que é muitas vezes defendido, e que inicialmente pode parecer absurdo, mas quando analisado de perto não é assim tanto: somos a única espécie que bebe leite de outra espécie e prolongamos esse consumo até a idade adulta. Não será esse leite adaptado às necessidades dos potros? Será que faz realmente assim tanto sentido beber leite? Graças à industrialização conseguimos aumentar a produção de leite e manipular a sua composição adaptando-a às nossas necessidades, tornando-o um dos alimentos mais vantajosos de consumir; além do mais, inventámos tantos outros produtos alimentares que outras espécies também não dispõem e nós próprios não dispunhamos há muito tempo atrás, e isso não faz desses alimentos inadequados. Então porque faz do leite inadequado? O facto é que a intolerância à lactose, açúcar naturalmente presente no leite de vaca, ronda os 70% a nível mundial, e os 40% a nível da população portuguesa, e isso é dos principais indicativos de que não devemos beber leite de vaca. Mais ainda: grande parte da população a nível mundial tende, com o aumento da idade, a tornar-se intolerante à lactose, perdendo a capacidade de produzir a enzima responsável pela sua digestão. Biologicamente faz sentido, pois o leite serve para estimular o crescimento e desenvolvimento, coisa que já não acontece na idade adulta. Existem ainda imensos casos de alergia à proteína do leite de vaca, sendo muitos desses casos devidos à introdução precoce do leite na alimentação dos bebés, pois este leite apresenta proteínas grandes e complexas para o sistema digestivo dos bebés, não conseguindo digeri-las e levando o organismo a identificá-las como "corpos estranhos", criando defesas contra as mesmas. Essa reação não acontece nunca no leite materno. Dá que pensar não dá? E se para os intolerantes à lactose é possível recomendar leite sem lactose, para os alérgicos à proteína do leite de vaca essa questão contorna-se apenas com a exclusão dos lacticínios - e de alimentos que os contenham - da alimentação.
Que conclusão tiramos disto tudo?

Sei que foi um texto extensivo, mas este é realmente um assunto com muitos aspectos a ter em conta para tomar uma decisão consciente e informada. Espero que tenham ficado mais esclarecidos neste tema, tanto quanto eu posso afirmar que fiquei.
Beijinhos,
Joana Ferreira
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